quarta-feira, 4 de junho de 2008

Brasil precisa de 350 mil novos enfermeiros, urgente

Entrevista - Nome: Maria Goretti David Lopes, Pedigree: presidente da Associação Brasileira de Enfermagem

Publicado em 22/04/2008 | Viviane Favretto

A presidente da Associação Brasileira de Enfermagem (Aben), a paranaense Maria Goretti David Lopes, diz que o número de enfermeiros com nível superior no Brasil precisa dobrar para que haja profissionais suficientes para atender a demanda em todo o país. Ela explica que a deficiência está, especificamente, na quantidade de enfermeiros com graduação, capazes de assumir a coordenação de equipes. Não faltam aqueles com cursos de nível médio e técnico. Segundo Maria Goretti, é preciso formar pelo menos 350 mil enfermeiros.

Este é um dos assuntos tratados no 2º Seminário Internacional sobre o Trabalho na Enfermagem, que terminou sábado. Os profissionais, reunidos em Curitiba, também questionam a qualidade dos cursos de Enfermagem que estão sendo criados no Brasil.

Maria Goretti afirma que a abertura de cursos é positiva porque ajuda a formar mais gente, mas ela teme que não esteja havendo a preocupação com a qualidade.

Qual é o número de profissionais atuando no Brasil? Somados os enfermeiros com nível superior, nível médio e técnicos, são mais de um milhão. Respondemos por 60,2% da força de trabalho em saúde no Brasil. Tem muita gente, mas o que falta é o profissional graduado, responsável pela coordenação das equipes de trabalho. Desses, temos 350 mil.

Mas não faltam cursos de graduação na área de Enfermagem? Temos um número grande de novos cursos e escolas aprovadas pelo MEC (o Ministério da Educação). De janeiro a março deste ano foram 33 projetos que entraram no MEC e 19 foram aprovados. Ao mesmo tempo que queremos ampliar o número de profissionais enfermeiros no Brasil, nos preocupa a posição do MEC, que autoriza esses novos cursos e joga no mercado profissionais com formação duvidosa numa área estratégica que é a área da saúde. É temeroso criar cursos sem saber se eles têm qualidade, se de fato têm laboratórios, condições para formar os profissionais. A discussão é complicada porque é dúbia. Nós queremos sim mais enfermeiros, mas queremos com formação de qualidade, perfil e competência para dar conta das necessidades das pessoas que procuram os serviços de saúde no Brasil. Além disso, há o problema da falta de cursos em lugares distantes, em pequenas cidades. Eles continuam concentrados em capitais e nas regiões Sul e Sudeste.

E o que é preciso fazer para melhorar a qualidade dos cursos de graduação? Nós, da Associação Brasileira de Enfermagem, estamos definindo a necessidade de cada projeto de curso passar pelo crivo da Comissão Intersetorial de Recursos Humanos do Conselho Nacional de Saúde. É preciso saber se determinado local precisa de um curso de Enfermagem, se há mercado de trabalho, se a instituição tem condições, tem laboratório, tem biblioteca, corpo docente adequado ao número de alunos. Nós queremos que o MEC, junto com Ministério da Saúde, invista nesses processos criteriosos. Que só libere a abertura de cursos quando esses pontos sejam atendidos.

Há muitas pessoas interessadas no curso de Enfermagem? É uma profissão que cresce no Brasil. A procura é grande. Os vestibulares têm uma concorrência, em média, de 20 candidatos por vaga.

A senhora também defende que o Brasil dê prioridade à medicina preventiva. Eu prefiro usar o termo promoção à saúde. Além da prevenção, você adota ações para promover a saúde. Com isso, reduz custos dentro do sistema de saúde e diminui o ônus social. Não se fala apenas do custo com a assistência na rede hospitalar, que é altíssimo. Existe o custo social porque o trabalhador tem que se ausentar do trabalho para fazer o tratamento. Então, é preciso investir em um sistema que promova a saúde e não a doença. Claro que isso envolve um conjunto enorme de fatores, um trabalho intersetorial, porque você precisa melhorar as condições de vida, de renda e empregabilidade. É complicado, mas esse é o desafio colocado para o Brasil e para todos os sistemas do mundo. A questão não é só nossa.

O Brasil está caminhando para isso? O Sistema Único de Saúde coloca bem claro quais são os princípios, as diretrizes da integralidade da assistência, a descentralização. São duas décadas perseguindo isso. Está na lei, na Constituição brasileira. A Associação Brasileira de Enfermagem está lutando pela consolidação desse sistema Ele está em processo de construção, precisa de investimento, de organização das estratégias. E a participação popular é cada vez mais importante.